Receita de bolo
Do alto dos seus três anos e meio de idade, sabia bem o que queria, e anunciou:
A avó, com toda a paciência e docilidade típica das avós, sorriu e concordou de imediato:
Está bem, vamos fazer um bolo!
Não, vovó, você, não! Quero fazer sozinha!
Chamava-se Nina e era a princesinha de toda a família. Filha única, neta única, afilhada e sobrinha única: em tudo ela era única. Até no jeito faceiro de dizer e desdizer as coisas. A avó, que se chamava vovó mesmo, conhecia o temperamento da netinha. E sabia como lidar com ela.
Mas Nina, você precisa de uma ajudante! Todo chef tem um ajudante. Deixa a vovó brincar também, vai!
Tá bom, mas você vai ser ajudante! E não é brincadeira: eu quero fazer um bolo de verdade!
Eu sei, meu anjo, eu sei – a avó continha-se para não rir da neta.
Um por um, a vovó foi colocando todos os ingredientes na bancada da cozinha. Pegou ainda a batederia e o seu velho livro de receitas. Já fizera tantos bolos na vida que não precisava da receita. Mas queria que a neta visse o livro, conhecesse os ingredientes, soubesse fazer uma receita seguindo o livro.
Pronto, Nina! Está tudo aqui. Vamos começar?
Sim, vovó! - a neta estava felicíssima.
Primeiro nós vamos bater os ovos com o açúcar. Pegue os ovos, Nina.
A menina pegou os ovos. Olhava-os fixamente. Perguntou:
Vovó, como que a gente sabe qual ovo vira ovo e qual ovo vira pinto?
A avó coçou a cabeça. Que perguntas ela andava fazendo estes dias! Crescia rápido demais e suas dúvidas iam ficando cada vez mais difíceis de serem respondidas.
Bom, quem decide é o dono da granja. A galinha põe os ovos, ele corre e pega. Estes ficam sendo ovos, mesmo. Os que ele não pega a galinha choca. E aí viram pintos.
E a galinha não diz nada?
Não, não que eu saiba!
Isto é meio injusto, hein, vovó! A galinha devia poder dizer o que deveria ser feito de seus ovos.
É, eu sei, meu anjo, mas infelizmente as galinhas não falam. Você quer continuar fazendo o bolo?
Sim, claro!
Vamos lá. Misture o açúcar. Pode colocar a xícara toda. Muito bem. Agora é só bater um instantinho.
Depende.
Do que?
Da sua referência.
Qual o instantinho do bolo?
É o tempo do ovo ficar bem misturadinho com o açúcar. Pronto, viu? Acabou este instantinho.
E agora?
Põe a manteiga.
A vovó ia explicando e Nina ia fazendo tudo direitinho. Claro que com milhões de pergunta. A vovó levava todas as perguntas da neta muito a sério. Conhecia a sabedoria das crianças e tratava de tirar proveito do tempo que passava com a netinha. Ficaram durante quase meia hora fazendo a massa do bolo, e então a avó o colocou no forno – explicou que criança não pode mexer em fogo sob o risco de se queimar.
Pronto, Nina. Enquanto o bolo assa, vamos fazer a cobertura. Que tal de caramelo?
Eu gosto de caramelo!
Muito bem, vamos fazer, então.
Vovó, que árvore dá o caramelo?
A avó, distraída, não prestou atenção à pergunta.
Que, Nina?
O caramelo. Ele nasce em qual árvore? A laranja é na laranjeira, o limão no limoeiro, a banana na bananeira. Mas eu nunca vi um pé de caramelo!
Desta vez a avó não conseguiu se conter e soltou uma gargalhada. Nina franziu os olhos, contrariada. Não gostava que rissem dela. A vovó se desculpou:
Desculpe, meu anjo, mas sua pergunta foi muito engraçada!
Por que?
Porque caramelo não dá em árvore nenhuma! Vou te mostrar.
A avó pegou um tantinho de açúcar e colocou numa panelinha. Em segundos começaram a surgir umas bolinhas e em um minuto uma linda calda havia se formado.
Viu, Nina? Caramelo é açúcar derretido!
A menina soltou, também ela, uma gargalhada. Tinha entendido a graça da pergunta.
Terminaram a calda, o bolo estava assado. A avó o tirou com cuidado do forno, jogou a calda sobre ele. Nina quis enfeitar o bolo, e avó deu-lhe uns confeitos coloridos. O bolo estava pronto, afinal.
A vovó fez um suco para Nina e um café para ela. Sentaram-se as duas à mesa. Comeram, cada qual, duas fatias. Passaram o resto da tarde conversando.
Nina foi embora e a vovó pegou o livro de receitas. De todos os bolos que fizera na vida, este tinha sido, de longe, o mais gostoso. Achou que deveria fazer uma anotação. Onde estava escrito 'bolo para o lanche', ela riscou. Escreveu, por cima: 'bolo para a Nina'. E acrescentou, entre os ingredientes: adicionar uma pitada de curiosidade infantil e uma xícara de amor. Sorriu, fechou o livro.
Como era bom poder dividir as coisas boas da vida com quem amamos, pensou. E começou a contar os minutos para a próxima visita da neta.
1 comentários:
Ah, essa sabedoria das crianças, que nos fazem pensar nas coisas mais simples!!
Ah, essa sabedoria das vovós que realmente se importam com o que é importante, ou seja, tudo!!
Beijos, querida!
Aretusa, mamãe da Doce Sophia
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