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Mariana tem medo!

Mariana tem medo!



Mariana tem medo. Medo de que? Mariana tem medo de tudo! Tem um medo assim tão grande que sai de sua casa, dobra a esquina e ocupa todo o quarteirão. Muito medo para uma menina só.

A mãe de Mariana é medrosa, muito medrosa. Também ela tem medo de tudo. E é por isso que Mariana tem tanto medo: sua mãe acha que a vida é perigosa e vê dificuldades em tudo. Mãe e filha dão-se as mãos para encarar o medo, que está sempre ali, à espreita.

Se Mariana e sua mãe vão ao parque, são mil recomendações de cuidado:

'Cuidado para não cair enquanto corre!'

'Cuidado para não rasgar o vestido no escorrega!'

'Cuidado para não sair voando do balanço!'

'Cuidado para não se sujar nesta terra aí!'

E então Mariana fica parada vendo as outras crianças correndo, brincando no escorrega e no balanço, fazendo farra na areia. Não pode brincar de nada, de tanto medo de cair, rasgar vestido, voar do balanço e se sujar. As outras crianças a chamam, o tempo todo, para juntar-se a elas, mas o medo não deixa. Então ela fica ali, sozinha, brincando de estátua até a hora de ir embora – o que nunca demora muito, porque sua mãe tem medo da chuva, medo do trânsito, medo de dirigir à noite.

Na escola, todos os amigos sabem dos medos de Mariana. Então, tentam brincar com elas com coisas que não dão medo. Fazem desenhos – mas só de flores, nuvens e sol, porque Mariana tem medo de bicho, mar e bicho papão. Brincam de roda – mas bem devargazinho, porque Mariana tem medo de ficar tonta e cair. E contam os números e cantam bem alto. E isto, Mariana gosta tanto tanto tanto que até inventaram uma música para ela: ' Mariana conta um, Mariana conta um, é um é Ana...' Ela adora!

Um dia, entrou uma menina nova para turma. Ayla, a nova aluna, não tinha medo de nada. E achava graça nos medos de Mariana. Perguntava, sempre, o porquê de tantos medos, e insistia para que brincassem juntas:

  • Mariana, vamos correr!

  • Não posso, se eu cair, machuca!

  • Mariana, vamos até o escorrega!

  • Não posso, o meu vestido pode rasgar!

  • Mariana, vamos tomar picolé de chocolate!

  • Não posso, minha garganta inflama!

Ayla gostava de Mariana, e queria muito ver a amiga se divertindo. Ficou pensando e pensando no que poderia fazer. Um dia, teve uma ideia.

  • Mariana, vamos comigo até o parquinho?

  • Não posso me sujar, Ayla!

  • Mas eu brinco e você fica só olhando! Vamos, sim?

  • Está bem, mas eu não posso me sujar, está bem?

  • Está certo, vamos lá!

Foram, as duas, para o parquinho. Ayla subiu e desceu do escorrega várias vezes, balançou o mais alto que conseguiu, correu como uma doida e se rachou de tanto rir jogando terra para o alto. Mariana olhava a tudo quietinha, morrendo de vontade de matar o medo e brincar com sua amiga. Ayla percebeu o desejo de Mariana. Imunda e feliz, aproximou-se:

  • Olha, estou suja. Não tem problema, sabia?

  • Parece que não.

  • Você não quer brincar também?

  • É que eu tenho medo...

  • Ah, deixa de ser boba! Não precisa ter medo!

E então Ayla subiu no banco da praça e pulou para o chão, às gargalhadas. Mariana chegou a fechar os olhos, pensando que a amiga ia se quebrar toda. Nada! Ayla subia e descia pulando do banco, feliz da vida. Mariana não acreditava no que via. Ela não se machucou vez nenhuma! E ainda parecia gostar disto. Ayla se aproximou e disse:

  • A minha amiga Carol que me ensinou a pular assim. Ela sobe no sofá e dá um salto para o chão, sabe? Depois sobe e dá um salto ainda maior. Ela tem esta mania de sapo de pular pular. Eu brinco junto com ela e acabei pegando a mania. Vem, também!

Então, Ayla pegou a mão de Mariana e a levou para cima do banco, puxou-a para um salto estabanado no ar. Mariana tremia toda. Quando pisou no chão, era um misto de dúvida e felicidade. Não acreditava que não tinha se machucado. Como era bom pular! Subiu de volta no banco e pulou uma, duas, três, quinze vezes. Depois foi para o escorrega, para o balanço e se sujou na terra o mais que pôde. Correu atrás de Ayla e caiu. Ayla riu e disse: 'levanta logo!' Levantou, riu e continuou correndo. Caiu outras vezes. Levantou todas elas, inteira – fora um ou outro raladinho no joelho, que quase não doíam.

Ao voltar para casa, encardida de tanta sujeira, Mariana estava feliz. Sua mãe, no entanto, quse desmaiou ao ver a filha tão suja e começou a falar que:

'Voce podia ter se machucado feio!'

'Você podia ter rasgado o vestido!'

'Você podia ter perdido um sapato!'

Mariana riu e não discutiu. Disse apenas:

  • Eu podia uma porção de coisas ruins. E, no entanto, só aconteceram coisas boas! Eu podia ter me machucado, ao invés, me diverti muito. Eu não tenho mais medo. Se você quiser, eu te ensino a perder o seu, também!

E antes que a mãe de Mariana respondesse algo, a menina a pegou pela mão e subiu com ela no sofá. Puxou-a para o chão, dando um salto tão torto que as duas caíram, uma por cima da outra no tapete da sala. Mariana começou a rir. Sua mãe riu junto, aproveitando da felicidade da filha.

Deste dia em diante, Mariana nunca mais teve medo. De nada! Sua mãe ainda tem medo que aconteça alguma coisa com a filha. Mas tem aprendido, aos poucos, a não passar os seus medos adiante. Afinal, só se é criança uma vez. E ter medo, é bom para quê?

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