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A menina do cabelo cor-de-rosa



A MENINA DO CABELO COR-DE-ROSA


Era uma vez uma menina que tinha o cabelo cor-de-rosa. Rosa, rosa. Rosa como bala de morango. Rosa como algodão doce. Rosa como um bicho de pelúcia cor-de-rosa que enfeita quarto de bebê. Tinha os cabelos compridos e os balançava ao vento, para lá e para cá, em rodopios dançarinos. Rosa que dançava ao vento tão bonito que parecia um carrossel. Tão lindo!
A pele da menina do cabelo cor-de-rosa era branquinha, muito branquinha. Talvez por isso o cabelo parecesse ainda mais rosa. Seus olhos curiosos tinham a cor do céu antes de chover. Um cinza tão intenso que nos fazia esperar pela chuva. E chovia. De vez em quando, os olhos da menina do cabelo cor-de-rosa choviam. Quase sempre escondidos, choviam.
A boca da menina do cabelo cor-de-rosa tinha um sorriso tímido. Ele parecia sempre se esconder atrás de um ou dois tufos de cabelo. Quando os olhos choviam, ele se escondia bem fundo e ninguém o via. Mas os olhos paravam de chover e ele aparecia, timidamente, como um raio de sol no meio das nuvens. E quando ele aparecia, o rosto da menina do cabelo cor-de-rosa se iluminava.
As pernas da menina do cabelo cor-de-rosa eram cansadas. Pareciam se mover devagar, devagar como um rio na seca, sem pressa de chegar onde tinham que ir. Já os seus braços eram ávidos. Moviam-se rapidamente e tudo acontecia como num filme: o braço inquieto, sabendo o que viria, a picada de mosquito- e então o braço imóvel e a cabeça girando. Todo o corpo num torpor desconfortável, enquanto a mente sonhava em voar para longe dali.
A menina do cabelo cor-de-rosa estava entrando na sua quarta década de vida e, há muito, já deixara de ser menina. Mas, ao ouvir do homem de branco a notícia, algo se deu dentro dela. Uma vontade de viver, mais do que nunca. Uma vontade de voltar a ser criança e deitar no colo de sua mãe onde nunca nunca nunca mal nenhum seria capaz de lhe alcançar.
A menina do cabelo cor-de-rosa nasceu sem cabelos. Teve cabelos escuros, por muito tempo compridos. Depois, não teve mais um único fio na cabeça. E foi então que resolveu mudar. E quis ter os mesmos cabelos da sua boneca preferida. E teve os cabelos cor-de-rosa durante muito, muito tempo.
A menina do cabelo cor-de-rosa pode estar sentada ao seu lado, neste momento, e você nem sabe disso. Ela viu muitas outras meninas, com e sem cabelo, alcançarem a lua e virarem estrelas lindas, que iluminam suas noites. Mas ela continuou aqui. Com o cabelo crescendo, quase todo preto – alguns fios brancos, que ela não disfarça mais. E uma única mecha mínima, imperceptível aos olhos desatentos, cor-de-rosa. Para que ela sempre se lembre da sua história e a leve adiante.




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Meu querido elefante



Meu querido elefante


Se conheceram por acaso, sem que ninguém pudesse adivinhar o quanto se amariam. Ele, com apenas dois anos de existência, não sabia dizer quando o vira pela primeira vez. Ele estava ali, ao seu alcance, desde sempre: estava em seus livros, em um brinquedo de pelúcia, em um jogo de memória e até mesmo em uma de suas camisetas. Mas ele o amou mesmo, de verdade, quando o viu através da tela da televisão da sala. Estava em todo seu esplendor, rolando na lama, jogando água para o alto, correndo. Ele, o elefante. E o menino encantou-se com aquele novo amigo.
O elefante, claro, o amou de volta. Porque elefantes são bichos grandes, com corações imensos que amam enorme. O menino sentia este amor. Logo, tornaram-se melhores amigos. Dia e noite o menino repetia que queria ver o elefante. O pai ligava a televisão e lá estava ele, fazendo graça, rindo feliz. A cada dia os dois se enamoravam mais um do outro. O elefantinho de pelúcia, até então apenas mais um brinquedo, passou a ser o companheiro da hora de dormir. Os livros iam com ele para a escola, onde ele mostrava a todos os amigos seu maior amigo. Todos gostavam dele, todos o queriam por perto.
Um dia, o menino resolveu que era muito chato ele ficar sentado na sala, com o elefante dentro da televisão. Era muito melhor se o elefante estivesse ali, ao seu lado, brincando de carrinho com ele. Pediu para a mãe, para o pai, para a avó, para o padrinho. Pediu para quem estivesse por perto. Queria muito, muito, muito um elefante de estimação. Um elefante só para ele, para lhe fazer companhia o tempo todo. Nada. Todos disseram a mesma coisa: 'elefante não é animal de estimação!'
Ficou triste, triste. Queria tanto um elefantinho para chamar de seu... Passou dias amuado, pensando nisso. O pai notou. No sábado, deu-lhe banho, colocou uma roupa de sair e anunciou:'tenho uma surpresa!' Saíram de carro. Quando pararam, o menino não sabia onde estava. Mas gostou do que viu.
Aquele era um sábado de sol, um dia perfeito para ir ao zoológico. O menino já tinha estado ali com os pais, mas era tão pequeno que não se lembrava mais. O pai o pegou pela mão e, pelo caminho inverso, entrou no zoológico buscando o elefante. No caminho, pararam para ver os macacos, o leão e a girafa. O menino gostou de todos. E então, no canto, ele estava parado. Enorme, enorme, enorme. Muito maior que nos livros e na televisão. Quieto, melancólico. O elefante.
O pai tinha certeza que o menino daria pulos de alegria. Mas, ao contrário do que se pensava, o menino olhava para aquele animal imenso com um misto de curiosidade, respeito e medo. Não esboçou um sorriso, não faz uma gracinha. Olhava-o fixamente, como se quisesse gravar cada detalhe do bicho. Ficou parado, diante dele, durante um bom tempo. Até que o animal levantou de seu cansaço e aproximou-se deles. O menino pediu colo e quis ir embora. Dormiu no caminho de volta para casa.
Quando chegaram, o menino não pediu para ver o elefantinho na tevê. Foi para o quarto, pensativo. Brincou de carrinhos durante horas. Então, saiu do quarto e pediu à mãe lápis e papel. Rabiscou, rabiscou, rabiscou. Ao final, disse alto: 'elefante!' e deu significado àquelas linhas disformes. O pai e a mãe aplaudiram: 'muito bem!' Ele sorriu. Dobrou o papel em quatro partes, colocou no pequeno bolsinho que ficava na camiseta, com todo cuidado. A mãe estranhou:
  • Filho, você vai guardar seu desenho na blusa? Vai acabar perdendo! Vamos colocá-lo na geladeira, para todo mundo ver.
O menino olhou-a com espanto.
  • Não é um desenho, mamãe. É um elefantinho. O meu elefante! Ele veio comigo escondido e agora mora aqui no papel, dentro da minha blusa.
A mãe sorriu, feliz, da doçura do filho. 'Como é bom ser criança e ter tanta imaginação.'
O filho sorriu, triste, do ceticismo da mãe. 'Como é ruim ser adulto e esquecer que podemos guardar quem nós quisermos dentro do coração'.
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A pituchinha

A Pituchinha

Numa loja de brinquedos, moravam muitas bonecas e bonecos bem juntinhos nas prateleiras. Durante o dia, a loja ficava cheia de gente: mães, tias, avós e amigos procurando presentes para dar às crianças.Quando a noite chegava, as luzes se apagavam, as portas se fechavam para só abrir novamente na manhã seguinte.Todos os brinquedos deviam ficar bem quietinhos para não fazer bagunça na loja.O problema é que nem todos conseguiam...

Pituchinha

- Olá! Eu sou a Pituchinha, uma boneca muito levadinha, que vive se metendo em confusão. Hoje queria ficar bem quietinha na noite, mas vi quando chegou aquele maravilhoso doce de leite, que foi guardado lá na cozinha... Mmmm, que fome! O que fazer?

Doce

Olhei para um lado e para outro da prateleira onde estava, e logo achei meus melhores amigos: Pompom e Polichinelo.

- Vamos dar um passeio na cozinha para comer só um pouquinho de doce de leite?

Pompom- Eu quero, disse Pompom.

Polichinelo- Eu também, disse Polichinelo. Mas como vamos enganar o guarda?

É verdade: os brinquedos eram proibidos de sair da estante, e durante toda a noite o guarda tomava conta da loja. A tudo ele vigiava e, quando dormia, era com um olho aberto e o outro fechado. Depois trocava: um olho aberto e o outro fechado... Não parava nunca, nem deixava de ver nadinha!

Piscando- Já sei! Vamos bem de mansinho, andando só quando ele fechar um dos olhos, depois paramos todos juntos.

E assim foram bem devagarinho: pé cá, pé lá... pé cá, pé lá ... pé cá, pé lá ...

E chegaram à cozinha escura. O guarda não viu nada.

Todos procuraram pelo pote de doce de leite, mas acabaram descobrindo que ele foi guardado lá no alto, dentro do armário.

Pompom esticou bem seus bracinhos, mas suas mãos não alcançavam a porta de cima do armário da cozinha.

Polichinelo também tentou, se esticando todo, mas não conseguiu chegar perto.

A Pituchinha então disse:

Cada um de nós sozinho nunca vai provar aquele delicioso doce de leite que está lá em cima. Meu plano é subirmos uns nos ombros dos outros para alcançá-lo, e então...

Todos gostaram da idéia, e foram logo fazendo. Primeiro foi Polichinelo, que era o mais forte. Depois Pompom subiu em seus ombros, e por último subiu a Pituchinha, que esticou bem os bracinhos e abriu a porta de cima do armário. O pote de doce de leite estava lá no fundo, e sua mãozinha estava quase conseguindo agarrá-lo. Deu mais uma esticadinha, tentou uma puxadinha e então...

O pote de doce de leite escorregou, voou na parede e ...

Bum!

Ih caramba!

Espalhou doce para todo lado. E o pior, com o barulhão, na certa o guarda iria pegá-los...

Guarda

E pegou. Ficou muito zangado com aquela bagunça toda, que ele não queria limpar.

Foi então que teve uma idéia: guardou cada bonequinho em sua caixinha, bem preso por uma fita, para só se soltar na casa da criança que ganhar aquele brinquedo.

Desse dia em diante, as lojas de brinquedo passaram a guardar seus bonecos bem fechadinhos em caixinhas - para que não façam bagunça na loja de noite. Já reparou como eles vêm bem embaladinhos?

FIM

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O homem cheio de risada - Alexandre Rampazo

Alexandre Rampazo

Do espetáculo da noite anterior só havia restado sacos de pipoca vazios e chicletes colados nos assentos, papéis de bala, palitos de algodão-doce e todo resto de diversão daquelas pessoas que foram ao circo à procura de um punhado de alegria.

Da fenda da lona listada em vermelho e branco, por trás do picadeiro e indo em direção à plateia vazia, surge uma vassoura que ia e voltava recolhendo aqueles restos de felicidade espalhados pelo chão.

Quem guia a vassoura é um magro e tristonho palhaço. Seu sapato é grande e vermelho, seu macacão é longo e colorido, e no rosto pálido coberto de maquiagem, tem pintado logo abaixo do olho direito uma lágrima, que nunca desliza, e fica ali, lembrando-o de sua tristeza. Ele é o palhaço mais triste do mundo por que não sabia fazer rir e se sentia vazio por isso. O dono do circo, já zangado por ter o palhaço mais sem graça do mundo, lhe deu uma vassoura e o serviço de faxineiro do circo.

Naquela noite, enquanto varria, notou algo diferente entre os restos de lixo no chão. Olhou encantado por toda a volta, e se perguntou como não havia visto antes o monte de risos e sorrisos ali soltos, espalhados pelo chão. Correu para recolher aquela porçado de felicidade em forma de risada. Eram risadas ardidas e explosivas. Outras baixinhas e contidas. Tinha até algumas risadas que pareciam soluçar.

Pegou algumas e juntou em suas mãos. As risadas tinham cheiro doce. Comeu, e tinha gosto de felicidade. Comeu, comeu e comeu até se encher de risadas. Apagou a lágrma em seu rosto e desenhou uma estrela.

Na noite seguinte, quando as cortinas se abriram, o palhaço fez sua melhor palhaçada. As risadas da platea lotada lotaram o picadeiro e eram sem fim.

Sentada assistindo ao maior espetáculo da Terra e com a barriga doendo de tanto rir, a menina apontou para o palhaço e disse bem alto, sem pensar em mais nada: “Vejam! O palhaço é um homem todo cheo de risada”.


Alexandre Rampazo
Escritor e ilustrador de diversas obras - como A Menina que Procurava - deixou o trabalho como diretor de arte para se à paixão pela literatura infantil


HISTORINHA PUBLICADA NA REVISTA CRESCER

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Narciso quer ir à lua - parte final



Narciso quer ir à lua - parte final



Narciso acordou antes do despertador tocar. Estava ansioso, ansiosíssimo! Contava os segundos para chegar à lua. Correu até o armário do pai e pegou outro cinto. Era preciso instalar mais um, para que Júlia pudesse viajar em segurança. Desceu as escadas voando até o quintal. Olhou sua nave, e só então reparou. As bombinhas não fizeram a nave levantar voo, mas queimaram parte da pintura. Pegou as tintas e, rapidinho, fez os retoques. Pronto. A nave estava tinindo de nova outra vez! Mal ele terminou e Júlia chegou sorridente.

  • Nossa, Narciso. Como a sua nave tá bonita!

  • Acabei de pintá-la de novo. Trouxe os biscoitos?

  • Trouxe. Posso pintar umas flores, para verem que eu também estou na nave?

  • Pode. Mas só duas flores, para saberem que a nave é de menino!

  • Quatro!

  • Três!

  • Está bem, três. Mas na parte de trás!

  • Eu pinto do lado. É mais bacana.

  • Está bem, mas anda logo. Temos que ir e voltar antes do almoço.

  • Tá, tá. Então me ajuda aqui.

Os dois viraram a nave de lado e a menina pintou três flores: uma rosa, uma vermelha e uma amarela. Em cima delas, escreveu: Nave do Narciso e da Júlia. O menino reclamou:

  • A nave é só minha, Júlia!

  • Se não for minha também, não te dou o combustível!

Os olhos do pequeno viajante brilharam. O combustível! Ela conseguira, afinal?

  • Você trouxe?

  • Claro que sim! Não disse que ia trazer?

  • Qual é o combustível?

  • Gasolina, claro.

  • Você acha que é o combustível certo?

  • Ora, Narciso, se faz carro andar, vai fazer a nave andar também!

  • E como você conseguiu gasolina?

  • Peguei da mobilete da minha irmã. Mas, olha... se ela te perguntar, não fui eu não, hein!

  • Tá, tá.

  • Promete?

  • Prometido! - disse Narciso, esticando a mão para outro aperto de mãos. Ele e Júlia tinham muitos acordos e segredos e um nunca seria capaz de trair o outro.

  • Então. Onde colocamos a gasolina? - continuou Júlia.

  • As bombinhas eu colei na parte de baixo da nave...

  • Mas a gasolina não dá, né, mané! Tem que ter um tanque.

  • Tanque? A gente vai lavar roupa ao invés de comer queijo, é? - debochou o menino.

  • Não, não. Ai, você não sabe de nada, mesmo. Tanque de combustível, óbvio!

  • Eu não tinha nem pensado nisto... - confessou Narciso.

  • Pois trate de pensar! A gente tem que colocar a gasolina em algum lugar, senão não saímos do chão.

  • Aguenta aí que eu já volto ! - disse Narciso, correndo para dentro de casa.

O menino foi até seu quarto e revirou tudo. Achou, enfim, o que buscava. Pegou e voou de volta para o quintal.

  • Pronto, tá aqui! - anunciou.

  • O que é isso? - Júlia não sabia o que era aquele brinquedo.

  • É meu batmóvel! Olha só, ele tem um tanque bem grande aqui atrás – disse Narciso, virando o carro para mostrar à amiga.

  • Então tira ele e põe do lado da nave.

  • É pra já!

Narciso tirou o tanque do batmóvel, um carro enorme no qual ele conseguia subir e pilotar até o ano anterior. Agora crescera mais e o brinquedo se tornara pequeno. Mas o tanque ainda serviria, com certeza. Pegou mais fita durex e, sob o atento olhar de Júlia, pregou o tanque na lateral da nave. A lateral sem as flores, claro!

  • - Pronto. Tá instalado – comunicou o menino.

  • - Então abre a tampa que eu vou colocar a gasolina – disse Júlia, tirando de dentro de sua mochila uma garrafinha de água cheia do combustível.

A menina despejou devagar todo o líquido dentro do tanque improvisado. Sem que precisassem dizer uma única palavra, os dois amigos se olharam. 'A hora é esta', era a frase dita no silêncio do olhar. Narciso puxou os dois cintos, pegou o menor e estendeu para Júlia. A menina afivelou-se sem problemas, enquanto o amigo fazia o mesmo. Num piscar de olhos a nave estava pronta para decolar, com o tanque cheio de combustível e a tripulação a bordo.

  • E agora, Narciso? - perguntou Júlia

  • Agora a gente liga a nave.

  • Como?

  • Bom, era para ser uma chave, mas eu instalei a lanterna. Serve de farol extra e chave de ignição.

  • Ah, tá. Liga, então.

  • Vou ligar, se prepara!

Narciso ligou a lanterna. Nada. Desligou, ligou de novo. Nada. Tentou uma terceira vez. Júlia ficou impaciente.

  • Esta chave de ignição não funciona. Melhor a gente tentar outra coisa.

  • Como o que?

  • Não sei...

  • E se a gente jogasse uma bombinha de São João dentro do tanque?

  • Será que funciona?

  • Acho que sim.

  • É, não custa tentar.

  • Espera aí rapidinho que eu vou lá no meu quarto buscar e já volto.

  • Vai logo!

Narciso pegou a última bombinha que tinha, uma caixa de fósforos e foi para o quintal. Júlia já tinha tirado o cinto e o esperava do lado de fora da nave, com o tanque de combustível aberto e o forte cheiro de gasolina exalando pelo ar. O menino aproximou-se dela, mostrando a bombinha e os fósforos e...

Foi justamente neste minutinho que a mãe de Narciso chegou do mercado.

Chegou e levou um susto: de onde vinha aquele cheiro? Ao encontrar o filho e sua amiga à beira de tacar fogo na gasolina, perdeu a cor por um segundo. Apenas por um segundo, porque no seguinte ela já estava de fôlego refeito lhes dando uma tremenda bronca:

  • Vocês estão doidos? Querem incendiar tudo? Se jogarem fogo aí dentro não vai ter foguete indo pro espaço, vai ter vocês dois e a casa inteira junto, picadinhos pelos ares!

E foi só então que as duas crianças se deram conta do perigo que estavam correndo. Gasolina causa incêndios horríveis. Como não tinham pensado nisto antes? Envergonhado, Narciso disse timidamente:

  • Desculpa, mamãe, nós não pensamos direito. Tudo o que queríamos era ir até a lua para comer queijo...

  • Comer queijo na lua? - perguntou Dona Lúcia, mãe de Narciso.

  • Comer o queijo da lua – corrigiu Júlia.

  • Que história é esta?

E então Narciso e Júlia contaram para Dona Lúcia que a lua era feita de queijo – pelo menos foi isto que o primo da Júlia lhe dissera – e que estavam construindo uma nave espacial para ir até lá tirar umas lasquinhas.

Ao final da história, a mãe de Narciso já havia se esquecido do perigo, da bronca, de tudo. Estava às gargalhadas.

  • Só vocês, mesmo... - disse, rindo. - Em primeiro lugar, a lua não é feita de queijo, e sim de uma matéria rochosa. Em segundo, ainda que fosse feita de queijo, para chegar lá vocês precisariam estudar muito, tornarem-se astronautas e viajar numa nave apropriada. E em terceiro, para comer queijo vocês não precisam ter tanto trabalho. Eu acabo de trazer um queijo delicioso do mercado e vocês podem comer o quanto quiserem. Contanto que prometam se comportar e não se meter mais em confusão!

  • Nós prometemos! - disseram os dois, ao mesmo tempo.

Então Narciso e Júlia entraram e comeram queijo e queijo e queijo até se cansarem, sem nem precisar sair de casa.


E este seria o fim desta história, não fosse Narciso, além de guloso, curioso até não poder mais...

Ele ficou na dúvida entre quem estaria falando a verdade e resolveu tirar sua teima. Cresceu, sempre muito estudioso, e tornou-se um grande astronauta. Um dia ele chegou lá, na lua. Tocou no solo, viu do que era feito. Sorriu satisfeito e voltou para casa feliz...


Você quer saber se a lua é feita ou não de queijo? Então você pode ser um astronauta, como o Narciso. E, quando você descobrir, me conta!



Não gostou deste final? Tem outro:



E este seria o fim desta história, não fosse Narciso realmente o menino que mais gosta de queijo no mundo. Narciso cresceu sabendo distinguir os diferentes tipos, a origem, a

a consistência certa dos queijos. Tornou-se um renomado chef de cozinha, aplaudido no mundo todo por suas receitas de queijo. E Júlia, sua amiga de infância, continua sendo sua parceira. Até hoje é ela quem está ao seu lado, opinando na hora de decidirem o cardápio do restaurante que os dois montaram juntos...




Quer mais um final?



Crie você! Coloque Narciso e Júlia na nave e os leve à lua; faça com que eles tenham uma dorzinha de barriga de tanto comer queijo; que eles se tornem amigos dos ratos de toda a vizinhança e dividam com eles todo o queijo do bairro. Invente o que quiser! E depois me conte como ficou! :)

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Narciso quer ir à lua - Parte 1

Narciso quer ir à lua



Narciso acordou com uma vontade danada de ir até a lua. Estava com esta vontade desde a tarde do dia anterior quando, no recreio, Júlia lhe disse que a lua era todinha feita de queijo. E Narciso era o menino que mais gostava de queijo no mundo: branco, amarelo, cremoso e até aqueles bem fedidinhos –

Narciso devorava todos! Quando soube, então, que a lua era feita de queijo, nasceu nele uma vontade grande, grande, grande, de ir até lá.

Depois do café da manhã – onde sempre comia um queijo-quente, como era de se esperar -, começou a arrumar sua bagagem. Pegou uma mochila e abasteceu-a com tudo o que precisaria para sua viagem: um pacote de torradinhas, um pãozinho francês, três fatias de pão de forma e meio pacote de biscoito cream cracker. 'Vou ter bastante coisa para acompanhar aquele queijo todo', pensou. Abriu a geladeira e pegou ainda duas caixas de toddynho. Porque queijo dá um pouquinho de sede, vocês sabem.

Narciso saiu de casa e, logo na esquina, parou no ponto de táxi. Os motoristas conversavam distraídos, mas um logo reparou no menino. Foi até ele:

  • Olá, filho. Você quer ir para algum lugar?

  • Quero sim, senhor, e tenho pressa!

  • Sua mãe sabe que você está aqui na rua, sozinho?

  • Sabe, sim. Deixei um bilhete dizendo que daria uma saída e já voltava.

  • Muito bem. E para onde você quer ir?

  • Para a lua!

  • Para a lua?

  • Sim, eu quero ir para a lua! Me leva lá?

  • Desculpa, filho, mas eu não posso levá-lo até a lua.

  • Por que não? Eu tenho dinheiro, olha! - disse Narciso, catando várias moedinhas do bolso.

  • O problema não é este, garoto. O problema é que meu táxi não pode te levar até a lua.

  • Não pode?

  • Não. Não pode. Para isso você precisa de um táxi espacial.

  • E onde fica o ponto do táxi espacial?

  • Ih, rapaz, nesta você me pegou! Olha, eu acho que fica longe, em outro país.

  • Em outro país?

  • Pois é. E não sei se levam meninos, não. Acho que você teria que crescer mais um bocado...

Narciso voltou para casa triste. Como faria para pegar o tal táxi espacial? Como chegaria neste outro país onde fica o ponto? Pensou e pensou. Viu que era muito difícil pegar o táxi espacial, então teve uma ideia: construiria sua própria nave para ir até a lua!

O menino juntou tudo o que precisava para construir uma boa nave espacial. Pegou algumas caixas bem grandes de papelão, muitas tintas – era importante fazer uma nave bem colorida, para que os passarinhos saíssem de seu caminho – um farol quebrado de bicicleta, uma buzina, sua lanterna de escoteiro, tachinhas, fita durex e, claro, algumas bombinhas de São João.

A tarefa era dura, mas Narciso estava empenhado. Começou cortando as caixas de papelão. Com a fita durex, unia as pontas – que pregava com tachinhas, para ter certeza que aguentariam a viagem. Pintou a nave bem bonita, cheia de cores. Na parte da frente, colocou o farol (ele conseguiu ajustá-lo usando um tantinho de papel alumínio e nem dava para ver que estava

quebrado); acima dele a lanterna. Por dentro, instalou a buzina. Em toda a lateral, as bombinhas de São João. Agora só faltava zarpar rumo à lua! Pegou um cinto de seu pai, amarrou-o em volta da nave e se colocou dentro dele. Era muito importante estar com um cinto de segurança em uma viagem à lua, como vocês devem imaginar. Acendeu as bombinhas e…tec, tac, tec! As bombinhas estouraram, sem que a nave levantasse nem mesmo um tiquinho do chão.

  • Narciso, vem almoçar! Anda, senão você se atrasa para a escola!

  • Já vou, mamãe!

Narciso estava arrasado! Uma nave tão bonita, mas que não levantava voo. E agora já estava na hora da escola, hoje não conseguiria chegar até a lua.

Foi para a escola, cabeça baixa e ar distraído. Não prestou muita atenção ao que a professora dizia. Seu pensamento estava muito distante dali. Na lua...

Na hora do recreio, sentou num canto da quadra. Júlia chegou num pulo, perguntando de uma vez:

  • Ei, que bicho te mordeu hoje?

O menino contou, tintim por tintim, tudo o que acontecera. A amiga riu:

  • Você é bobo mesmo, hein, Narciso! Você acha que bombinha de São João é combustível de foguete?

  • Eu achei que dava para...

  • Deixa de falar besteira! Tem que ter algo que funcione de verdade.

  • Como o que?

  • Não sei... Vou pensar em alguma coisa e amanhã de manhã eu vou lá para tua casa. Mas você tem que prometer que me leva junto!

  • Eu te levo. Mas se você levar mais biscoitos, para podermos comer o queijo todo!

  • Combinado!

Os dois apertaram as mãos, selando o acordo. Amanhã, enfim, viajariam até a lua...

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Quero morar num sorvete - Penélope Martins

Penélope Martins (autora)e Rebeca Drumond (ilustradora)


Rebeca Drumond

Quero morar num sorvete
Pobre do Jacaré que míngua
Encolhido vai virar lagartixa
Parece mentira a fala minha
Mas até suor brota da língua!
Eis que surge uma ideia fabulosa
Refrescante, genial e gostosa
Uma explosão de contente:
QUERO MORAR NUM SORVETE!
Brisa suave, camisa de algodão
Chinelos de dedo, bermudão
Uma casinha de sorvete.
Sem calda de caramelo ou chantilly Sem confeito que derreta por aqui Uma casinha de sorvete
Não quero nada chique,
complicado
Tralhas que deixam tudo
melecado
E até vem bronca por ser
desleixado...
Gelado, simples, com sabor natural Pequenos flocos prismáticos
Casinhas de tamanho exato
Nada de fenomenal
Sem sofisticação
Um simples sorvete de limão.


Conto publicado na REVISTA CRESCER

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A partida de futebol

A partida de futebol




Era um domingo de sol e, como em todos os domingos, dia de futebol. Naquele domingo, no entanto, não haveria apenas uma partida: seria a decisão do campeonato! As duas maiores torcidas, cada uma de um lado do arquibancada, veriam seus craques correndo atrás da bola, deslizando pelo campo, buscando o tão sonhado gol. Todos estavam eufóricos!

Pouco depois das três o estádio já estava cheio. Os jogadores, na concentração,

combinavam o modo de ataque, a melhor defesa. Cada movimento contava, eles sabiam. Futebol é um jogo de equipe: precisavam estar bem afinados, todos no mesmo tom, para saírem vencedores. Dois times, dois concorrentes e a mesma vontade de levantar a taça.

Às quatro em ponto o juiz apitou e o jogo começou. E começou bem começado, com Dedé correndo direto entre seus oponentes, na gana de alcançar o gol. Conseguiu passar ligeiro e deu um chute forte...que foi parar nas mãos de Diego, o goleiro do outro time. Este foi apenas o primeiro de muitos lances ousados. Todos os jogadores, naquele domingo, viraram atacantes: todos eles queria fazer um gol, para desespero dos goleiros, que viravam e se reviravam como dava, tentando impedir a redonda de tocar o lado de dentro da rede.

Em uma jogada não ensaiada, Thiago conseguiu vencer a barreria inimiga e, para desespero de Fernando, o goleiro, marcou o primeiro ponto do jogo. Um a zero, a arquibancada do lado de cá quase veio abaixo! Gritos de 'é campeão' faziam tremer o estádio inteiro, enquanto o jogador, orgulhoso, jogava beijos para a plateia.

A disputa continuava acirrada e, não demorou muito, foi a vez da outra torcida comemorar. Alex conseguiu vencer a barreira de Diego e empatou o jogo, sob o grito de 'Vamos virar!' de sua torcida.

Bernardo passando para Felipe, Leandro impedindo, se jogando na frente da bola.

  • É falta! Foi no calcanhar dele! - gritava a torcida de cá.

  • Foi na bola! Foi na bola! - gritava a torcida de lá.

O juiz correu para o lance, mas não tinha visto o que acontecera. Lançou um olhar de súplica para o bandeirinha, que acenou. Foi falta, sim. Marcada na hora, o jogo seguiu.

Vieram outras faltas, veio um pênalti – perdido, para desespero do batedor e da torcida inteira! - vieram muitos lances. Gol, mesmo, não vinha. E então, de repente, veio, sem ser convidada, uma presença inesperada.

No meio daquela confusão de ataque e defesa, caiu o primeiro pingo sem que ninguém sentisse. Por pouco mais de um segundo, porque em seguida ela veio forte e impiedosa. A chuva!

A chuva encharcou os jogadores em minutos. A arquibancada esvaziou rapidamente, com muitos procurando abrigo. Os fanáticos continuaram ali, torcendo, empurrando os times para a frente. Os jogadores caíam no campo molhado, levantavam imundos. E continuavam correndo atrás da bola.

Os jogadores poderiam ter suportado a chuva o resto da partida. Era uma decisão de campeonato, afinal, não deveriam desistir por conta de um tantinho de água a cair do céu. Mas nem todo mundo pensava assim...

A primeira a aparecer, exatos seis minutos depois do começo da chuva, foi a Dona Almerinda. De capa e segurando um guarda-chuva, gritou para o artilheiro Dedé:

  • André, sai da chuva agora! Não quero você resfriado! Vamos embora para casa!

O menino não teve tempo de argumentar:

  • Mas, mamãe...

  • Nem mas, nem meio mas. AGORA! - disse, firme, obrigando o menino a deixar o campo.

Em seguida vieram a Dona Laura, a Dona Estela, a Dona Carmela... uma a uma, todas as mães do bairro correram até o campinho para levar seus campeões para casa.

A arquibancada improvisada com cadeiras de praia logo deixou de existir e o campinho de terra batida virou uma enorme poça de lama. Que triste fim para um campeonato... Mas só até domingo que vem, porque aí já é outro dia, com novos ânimos, muita animação e a vontade de ver seu time ser campeão de novo. Porque quando se é criança, todo domingo é dia de campeonato. E todo mundo que sabe aproveitar isto já é um campeão.

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Uma chuva diferente...

Uma chuva diferente



Tinha amanhecido um dia comum. Ou, ao menos, era isto o que eu achava. Quando se tem sete anos, os dias são parecidos. Este era um dia de férias, como tinha sido a véspera e seria o dia seguinte. Nas férias, a programação variava, mas sempre fazíamos as mesmas coisas. Íamos ao clube, à casa da vovó, visitar algum primo. De vez em quando íamos até um shopping. Longe, longe, que parecia não chegar nunca. E lá comíamos sanduíche, batata-frita, milk-shake. Coisas que só comíamos quando íamos ali, e por isso valia a pena o tempo da viagem. Mas, neste dia, não iríamos ao clube, ao shopping ou mesmo visitar alguém. Este dia, minha mãe anunciara, iríamos buscar o papai no trabalho. E estávamos radiantes com isto.

Estávamos prontas, minha irmã e eu, logo depois do café da manhã. Minha mãe nos preparou um lanche bem caprichado e disse: 'almoçaremos tarde hoje, quando encontrarmos o papai.' Parecia que, aquele dia, não seria mesmo um dia comum.

Entramos no carro, sentamos. Minha irmã apontava e contava carros, ônibus e caminhões. Eu me distraía rapidamente com esta brincadeira: bastava passar um cachorro na calçada que minha atenção era desviada para o animal, seu andar, suas cores... 'Dois carros vermelhos e um azul. Você está contando?', minha irmã me trazia de volta à sua rotina. Táxis, ônibus, caminhões. Um, dois, dez. 'Sim, estou contando.' E seguíamos viagem. Sempre assim.

Andamos um bom tempo, sem problemas. Até que, de repente, ninguém mais andava. Nenhum carro se mexia- nem para frente, nem para trás. Minha mãe parecia um pouco ansiosa. 'Saímos tarde demais de casa', ela disse, enquanto minha irmã aproveitava o congestionamento para fazer o censo de todos os carros à nossa volta.

Muito devagar, andamos e paramos. E assim seguimos, andando e parando. Minha mãe havia levado uma garrafa grande de água e toda hora nos fazia beber um tantinho. Até que, em algum momento, minha irmã parou sua pesquisa para anunciar: 'preciso fazer xixi!' Minha mãe a olhou em pânico:

  • Filha, será que você não aguenta esperar um bocadinho?

  • Preciso fazer xixi, mamãe. E tem que ser agora.

  • Está bem, eu vou procurar um lugar para estacionarmos o carro. Aguenta aí só um pouquinho.

  • Mas anda logo, mamãe, que meu xixi quer muito sair!

  • Aguenta firme, filhinha, vou procurar um lugar.

Minha mãe fez um sinal com a mão, o dedo em seta. Passou na frente de um carro, de dois, de três. Devagar, com minha irmã se contorcendo no banco traseiro, alcançamos um estacionamento. Minha mãe parou o carro já perguntando: 'onde tem um banheiro limpo por aqui?' O garagista indicou a direção, minha mãe pegou cada uma de nós com uma mão e saímos as três correndo.

Não lembro do banheiro, não lembro se eu e minha mãe também fizemos xixi. Mas lembro do que aconteceu em seguida. O lindo dia de sol foi encoberto por uma chuva sem fim. A chuva mais linda que já vi na minha vida.

Tínhamos acabado de sair do banheiro quando um sino deu uma badalada forte, muito forte. Minha irmã e eu começamos a rir. De onde será que vinha aquele barulhão todo? À primeira, seguiram-se outras badaladas. Minha mãe passou a mão na testa suada e disse: 'meio-dia. Estamos atrasadas, vamos procurar um telefone para avisar ao papai onde ele deve nos encontrar.' Começamos a andar para a beira da calçada. E foi então que a chuva começou, exatamente no instante em que o sino badalou pela última vez.

Quase que ao mesmo tempo, surgiram pessoas por todos os lados. Todos riam alto, todos apontavam para o céu. Minha mãe esqueceu o telefonema, riu também. Apontou para o céu e disse: 'olhem meninas, olhem!' E então nós vimos. Do alto do céu, descendo daqueles prédios enormes que tinham por ali, caíam inúmeros pedacinhos de papel, de todas as cores. Voavam sem direção, parecendo pequenas borboletas tontas. O céu estava coberto de cores e o sol parecia querer refletir cada uma delas. Azul, amarelo, vermelho, verde, rosa, prata... Um arco-íris vivo, que se deixava levar pela brisa antes de cair com delicadeza no chão. As pessoas começaram a se abraçar, como numa festa. Um senhor se aproximou de onde estávamos e disse: 'que o ano que vem seja de muita paz para a senhora e sua filhas!' Minha mãe sorriu e disse: 'e para o senhor e os seus, também!'

Outros vieram, outras palavras, alguns apertos de mão e abraços. Ainda demorou até que conseguíssemos encontrar um telefone, ligar e encontrar o papai. Mas, o que fizemos, eu não sei dizer. Porque deste dia, a lembrança que eu tenho é só esta: eu e minha irmã de mãos dadas, rindo, vendo um arco-íris vivo cair sobre nossas cabeças, enquanto, à nossa volta, todos tinham a certeza de um que um ano melhor se iniciava logo...



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O menino que não acreditava em Papai Noel







O menino que não acreditava em Papai Noel





Téo era um menino engraçado e esperto, que sempre questionava o porquê das coisas. Filho único de um casal que adorava viajar, Téo conhecia diversos lugares e, onde ia, fazia amigos. Era falante e extrovertido. Todos gostavam dele.

Quando entrou para a escola, Téo virou o xodó da professora e, em uma semana, era o melhor amigo de todos. Participava das partidas de futebol e basquete, cantava no coral da escola, jogava capoeira e até xadrez! Gostava de participar de todas as atividades da escola, mas a sua preferida eram as aulinhas de teatro. Lá, Téo era a estrela da turma: sugeria enredos, ajudava a montar cenários, criava, sozinho, peças completas. Dona Mariana, a professora de teatro, encantava-se com a disposição do menino. 'Este nasceu para a arte', dizia em alto e bom som a todos.

O final do ano se aproximava e começaram a organizar as festividades de Natal. Dona Mariana, como as outras professoras, estava planejando sua parte na grande festa que a escola iria fazer. Reuniu seus alunos e disse:

  • Meninos, nossa apresentação será o ponto alto da festa de Natal. Todos estão contando que façamos uma apresentação muito bonita.

  • Vamos fazer, sim – disse um aluno.


  • E todos os alunos começaram a falar ao mesmo tempo, cada um mais
animado que o outro, sobre que peça iriam fazer, quem interpretaria quem, como seria a parte musical... A sala, em um instante, estava uma bagunça, como todos querendo sugerir algo.
  • Silêncio, silêncio, por favor! - pediu, rindo, Dona Mariana. - Fico feliz em ver a animação de todos. Mas vocês já aprenderam que, como tudo na vida, uma peça precisa de muito empenho e dedicação. E se todos falarmos juntos ao mesmo tempo não chegaremos a lugar nenhum.

  • Desculpa, professora. - todos os alunos disseram ao mesmo tempo.

  • Tudo certo. Agora, ouçam. Todo ano, a turma de teatro monta um Auto de Natal. Já temos um cenário pronto, em que mostramos o nascimento do Menino Jesus...

  • Com licença, professora- disse Laís, levantando a mão.

  • Pois não, Laís.

  • Não é meio chato fazer a mesma coisa todo ano?

  • É exatamente nisto que eu ando pensando. O que vocês acham de nós fazermos uma peça nova, algo que nunca foi feito na escola antes?

  • É!Isso aí! Vamos sim! - a sala virou uma alegria, com todos os alunos aprovando a ideia ao mesmo tempo.

    - Eu tenho uma ideia – disse Téo, já pensando em todo o enredo de uma peça. Podemos fazer uma peça musical, com as doze badaladas do sino de Natal como tema!

  • É uma ideia linda, Téo – disse a professora – mas, na verdade, a peça tem que ser aprovada pela diretoria.

  • Eu tenho certeza que a diretora vai aprovar a minha peça, se... - disse Téo.

  • Eu sei que a diretora aprovaria, sim – interrompeu a professora. - Você tem ótimas ideias. Só que eu já mandei a peça, que já foi aprovada.

  • E sobre o que é a peça? - perguntou Luís Cláudio, um menino tímido que quase não falava.

  • A peça é sobre... o Papai Noel!

  • Papai Noel! - as crianças bateram palmas, gritaram, ficaram felizes em homenagear o Bom Velhinho.

No meio de toda a algazarra, Dona Mariana percebeu que Téo estava mudo.

  • Téo, não fique chateado. Sua ideia foi ótima, só que a peça tinha que ser pré-aprovada, e eu a mandei para a diretoria há semanas. Não queria dar a notícia a vocês antes de ter algo concreto.

  • Eu sei, professora, não fiquei chateado com isto, não.

  • Mas, então, o que houve? Está tão quietinho! Olhe, eu preciso da sua ajuda para todos os detalhes da peça.

  • Desculpa, professora, mas eu não sei se vou participar da peça...
  • Como assim?- perguntou Laís. - Você adora todas as peças Téo, deixa de ser manhosinho...
  • Não é manha, não! - disse, firme, Téo. Só que a peça não tem a ver comigo.

  • E eu achando que você ia ser o primeiro a se voluntariar para ser o Papai Noel – disse, meio que rindo, Dona Mariana.

  • Ora, professora, como eu posso ser alguém que não existe?

  • Que você disse? - perguntou Jonas, um menino da turma.

  • Que Papai Noel não existe. Não existe!

Todas as crianças pareciam querer voar no pescoço de Téo e a sala, novamente, virou uma bagunça, com todos falando ao mesmo tempo exaltados.

  • Silêncio! Turma, silêncio! - pediu, séria, Dona Mariana.

  • Professora, a senhora sabe que eu estou falando a verdade.

  • Téo, nem mais uma palavra. Depois da aula conversamos. Você tem o direito de não participar da peça, mas não de estragar o Natal dos outros.

  • Está bem, professora.


A aula continuou, com Dona Mariana explicando como seria a peça de Natal. No final, chamou Téo para uma conversa:

  • Téo, me explica isto direito. Por que você acha que Papai Noel não existe?

  • Eu não acho, eu sei!

  • E quem te disse isso? - questionou a professora.

  • Meus pais. Me disseram que o Papai Noel é invenção de uma

    indústria de refrigerantes para aumentar o consumo em dezembro. A senhora deve saber disto, não?

  • Sei, sim. Já ouvi isto antes. Mas, e você? Sabe que é São Nicolau?

  • São Nicolau... não, não sei.

  • Téo, vamos combinar assim. Você é livre para acreditar no que quiser. Eu tenho pena que você não acredite em Papai Noel, mas vou respeitar. Mas, do mesmo modo, eu exijo que você respeite seus colegas. Deixe quem acredita continuar acreditando, está bem?

  • Está certo. Mas... eles não deveriam saber a verdade?

  • A verdade Téo, é que você me disse que Papai Noel não existe. E para mim, ele existe. Cada um pensa uma coisa, e devemos sempre respeitar a opinião do outro.

  • Tudo bem, professora.

Téo saiu da sala. Do lado de fora, Jonas esperava por ele.

  • Eu ouvi o que você e Dona Mariana conversaram, Téo.

  • Não era segredo.

  • Mas, eu não entendo. Como você pode dizer que Papai Noel não existe?

  • Se você ouviu a conversa, sabe o porquê.

  • Sim, ouvi. Como já tinha ouvido o que você disse antes, da fábrica de refrigerantes, também.

  • Então você sabe que eu falo a verdade.

  • Então eu sei que você não tem fé!

  • Fé? Numa campanha publicitária?

  • Fé de que houve alguém, há muitos anos, que ajudava as crianças pobres. Que distribuía presentes.

  • Mas isso sempre há!

  • Nem sempre houve, Téo. Teve que haver o primeiro.

  • E você acha que foi Papai Noel? - disse, ironizando, Téo.

  • Eu acho que foi Jesus, que deu a vida por nós. O que celebramos no Natal, antes de mais nada, é a sua vida. O seu nascimento.

  • Pois então. Até aí, tudo bem. Concordo. Não tem nada a ver com esta historinha de Papai Noel!

  • Como não? Tem tudo a ver!

  • Ora, por favor! Você sabe, como eu, que Papai Noel não existe! - respondeu Téo, irritado.
  • Não. Você acha isto. E eu discordo. Porque eu tenho certeza que Papai Noel existe!

  • Lá vem você... Escuta, estou cansado deste papo, então...

  • Escuta só uma coisa, por favor -interrompeu Jonas.

  • O que é?

  • Como eu disse, houve alguém que, há muitos anos, primeiro se preocupou com as crianças. Até aí você aceita?

  • Sim, claro.

  • Pois bem. Esta pessoa, São Nicolau, distribuía presentes na época de Natal.

  • Sim, conheço a história.

  • Então. Mas ele fez mais do que isto.

  • Mais do que distribuir presentes?

  • Sim. Ele distribuiu algo muito maior.

  • O que?

  • Amor. Ele nos deu amor. Ele aproveitou a data em que comemoramos o nascimento de Jesus para fazer com lembremos da mais valiosa de suas lições: “Amemos uns aos outros”.

  • O que você está dizendo, então, é que...

  • O que eu estou dizendo é que o Papai Noel existe, sim. Existe dentro de cada um de nós que acreditam nele. Porque ele é uma luz, ele é a figura que nos lembra, nesta época, da importância em sermos solidários, generosos. Ele é amor! E, enquanto acreditarmos no amor, acreditamos nele!

  • Eu nunca tinha pensado assim...

  • Então, peço-te isso: vá para casa, pense em tudo o que conversamos. Na aula de teatro de amanhã, você dá sua opinião.

  • Está certo- disse Téo, despedindo-se do amigo.

  • Até amanhã.

Téo foi para casa e pensou em tudo o que Jonas tinha dito. Quase não dormiu aquela noite, tentando entender o sentido de tudo o que conversara com o amigo.

No dia seguinte, Dona Mariana reuniu a turma e perguntou se alguém tinha tido alguma ideia para a peça.

  • Eu tive! - disse Téo, levantando a mão.

  • Ora, que bom que você resolveu participar da peça.

    - Sim, resolvi. A minha ideia é simples: vamos fazer algo diferente. Não vamos dizer que Papai Noel trabalha o ano inteiro, que distribui presentes em uma noite. Vamos dizer a verdade!
  • Téo, eu fui bem clara, ontem, quando... - interrompeu Dona Mariana,

  • Me escuta, professora, por favor – pediu Téo. - Vamos dizer a verdade. Que Papai Noel não distribui presentes. Ele distribui amor. O Amor de que Jesus falava, o Amor Maior. O Amor que temos sempre que ter, uns pelos outros. O Amor que nos faz querer ajudar ao próximo, querer estar perto de nossa família e amigos. Porque cada presente, por menor que seja, tem um significado. Cada presente é um símbolo de carinho. E é isto que Papai Noel faz, de fato: dá carinho, dá amor.
  • Que lindo, Téo! - disse a professora.

  • Eu acho, professora – interrompeu Jonas – que o Téo entendeu o verdadeiro significado do Natal, e está cheio de ideias para a nossa peça!

  • Ah, estou, mesmo! - disse Téo.

Todos começaram a conversar, sugerir temas, cenários, músicas. O resto da aula, e as aulas seguintes, passaram voando até a apresentação.

No dia da apresentação, a peça foi um sucesso: todos aplaudiram de pé a linda montagem que os alunos fizeram e emocionaram-se com o texto. Os alunos e a Dona Mariana não cabiam em si de tanta felicidade.

No final da apresentação, Jonas despediu-se de todos e sumiu, sem que os demais percebessem. Num piscar de olhos ele estava no pólo Norte, com roupas verdes, ao lado do Papai Noel.


- É, Papai Noel. Mais uma criança que ouve mentiras a seu respeito.

  • Eu sei, meu filho. Eu não entendo como podem acreditar...

  • Eu também não entendo. O senhor tem aparecido cada vez

    mais, tentando conversar com mais e mais crianças, e ainda assim...

  • Tem aquelas que acham que eu não existo! - disse Papai Noel.

  • Exatamente.

  • Mas eu tenho sorte de ter ajudantes fiéis como você, Jonas. Que saem pelo mundo disfarçados para levar a minha mensagem de amor.

  • A sorte é minha, Papai Noel, de trabalhar aqui.

  • Pois é, e falando nisto temos muito trabalho a fazer. Vá descansar um pouco, que a noite vai ser longa...


E então Papai Noel levantou-se e pediu que seus ajudantes começassem a arrumar seu trenó. As renas estavam preparadas e, em poucas horas, começaria mais um voo. Um voo que acontece todos os anos, na noite de Natal, para levar amor às crianças do mundo todo!




Para todos vocês, meus queridos amigos,

um Natal abençoado! Que todos possam

sentir, todos os anos, a magia do Natal

invadir seus corações. Exatamente como uma

criança que, ansiosa, não consegue

dormir, esperando encontrar o Bom Velhinho...